segunda-feira, 9 de março de 2009
O ECOísta
Juntou todas as embalagens tetrapak da prateleira, como se fosse derrubá-las num só golpe, e colocou no carrinho. Seus braços nus, com a manga da camiseta dobrada e recolhida, exibiam seu porte atlético enquanto alcançava a última dúzia de barras de cereais sabor castanha no corredor seguinte. Chegou ao caixa, jogou tudo na esteira e passou no cartão. Atirou as sacolas no banco de trás do carro e saiu cantando pneu. Entrou na academia, fez uma hora de exercício, usou os vinte e dois guardanapos do dispenser para comer um lanche natural e deixou tudo em cima da bancada da lanchonete. Piscou para meia dúzia de garotas que entravam enquanto ele saía. Convidou duas para um fim de semana na cachoeira. Levou dois tapas na cara e saiu. Passou pelo estacionamento, lotado, até chegar à área verde atrás da academia, onde havia estacionado. Recolheu as multas por estacionar em local proibido, amassou e jogou no chão. Entrou no carro, girou a chave no contato, deu uma grande volta e saiu do gramado. No engarrafamento, tentando sair da cidade, tomou três caixas do seu suco. Uma acertou no catador de papelão, a segunda caiu no bueiro e a terceira provocou o acidente que parou o trânsito por mais uma hora e meia atrás dele. Já na rodovia, comeu todas as barras de cereais, deixando uma nuvem de embalagens coloridas para trás. Finalmente, o contato com a natureza. Saiu do carro com as sacolas na mão, uma toalha e seu ipod. Sentou debaixo de uma árvore, tirou mais uma caixa de suco de dentro da sacola e abriu. Quando pegou a caixa, a abelha que estava rodeando a caixa há um tempão, entrou pelo seu nariz. Ele não percebeu, concentrado na trilha sonora do seu fim de semana, puxou o ar com tudo até que perdeu a força. Tentou tomar um pouco do suco mas o líquido desceu quente e cheio de formigas. Desesperou-se e acabou enrolado no fio do fone de ouvido. A sacola do supermercado vazia veio com o vento e grudou o seu rosto. Engasgado e sem ar, caiu sobre a grama. Dois dias depois não apareceu para trabalhar e começaram a procurá-lo. Uma das garotas da academia comentou sobre a cachoeira. Os bombeiros encontraram seu carro aberto, forrado de panfletos e, mais adiante o seu corpo, sufocado, com a sacola no rosto e vestindo uma regata velha com a mensagem em serigrafia, quase apagada: “Recicle-se”.
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